quinta-feira, 15 de março de 2018

Para que(m) serve a estabilidade do servidor público?

Volta e meia o assunto "estabilidade no serviço público" ressurge e com as recentes manifestações de variados colegas sobre a mesma, senti a necessidade de escrever algo. Por "estabilidade" adoto aquela condição trabalhista obtida mediante aprovação em estágio probatório, após concurso público, muito embora existam outras formas de estabilidade (como a sindical).

ESTABILIDADE = PROTEÇÃO (do patrimônio público)

A estabilidade é muito mais que um direito do servidor público. É a proteção que os representantes do povo (políticos) criaram, numa época de raro compromisso com o país, para evitar que futuras autoridades perseguissem servidores pelo zelo com o patrimônio que é de todos, ou seja, patrimônio público. A estabilidade é o escudo que protege o servidor na luta em defesa do serviço público, dos recursos públicos, etc. Já a greve é a espada, instrumento de luta que intimida o mau gestor (político) a agir de acordo com o interesse público. Retirar a espada ou o escudo do servidor é tal como desarmar o policial, que protege a comunidade. Indefeso o servidor estará sujeito às arbitrariedades dos maus gestores, que saquearão ainda mais os cofres públicos.

ESTABILIDADE = ECONOMIA (em processos trabalhistas)

A estabilidade então não é apenas um direito do servidor e muito menos um privilégio. Tampouco retirá-la representa uma ação em defesa da economia dos recursos financeiros. Imaginemos que da noite para o dia os servidores pudessem ser demitidos, sem grave motivo, então haveria a necessidade de terem FGTS, certo? Na iniciativa privada o empregador evita as demissões sem justa causa, pois gera encargos para si (multa - que sai do seu bolso). Na área pública o chefe maior é o político, que não tendo preocupação com as multas que lhes serão aplicadas, pelas injustificadas demissões, abusará sem pudor, afinal elas não lhe pesarão no bolso, muito embora irão prejudicar os recursos financeiros.

ESTABILIDADE = MERITOCRACIA (os melhores colocados ocupam os cargos)

Mesmo a manutenção dos concursos públicos não é garantia de justiça. É possível apontar que a imoral classe política brasileira seria capaz de demitir candidatos mais bem colocados para "fazer a fila andar" e serem chamados seus "amigos". Imaginemos que um cabo eleitoral de um político passe em 10º colocado num concurso com 7 vagas. Poderia muito bem ele promover a demissão de 3 dos aprovados apenas para puxar para dentro um dos seus.

ESTABILIDADE = EFICIÊNCIA (atrai os melhores profissionais)

As melhores universidades brasileiras são as universidades federais e isso é um fato indiscutível. Isso mostra que é possível o serviço público atingir o mais alto grau de eficiência. A estabilidade aliada a boas condições de trabalho e remuneração adequada acaba atraindo bons profissionais, que estarão à serviço da coletividade. Se queremos um serviço público de qualidade em todas as áreas, devemos fortalecer o mesmo e não precarizá-lo retirando a estabilidade e direitos.

OUTRAS CONSIDERAÇÕES:

Há uma série de opiniões equivocadas contra o serviço público, das quais comento algumas:

1) GREVE: O funcionalismo público é tido como grevista e muitas vezes mal visto por isso. Porém, uma das greves mais comuns e que mais impactos trazem na sociedade é dos rodoviários, que em grande maioria é um trabalhador da iniciativa privada. Não é a estabilidade que gera greves, embora ela permita maior liberdade de ação no interesse do bem comum;

2) GREVE (aspectos financeiros): O servidor público não tem data-base ou convenção coletiva, logo só conseguem algum reajuste salarial pela utópica iniciativa do político gestor OU por paralisação/greve;  

3) Sem FGTS, sem estabilidade e sem tranquilidade da estabilidade para fazer greves, estará o servidor sujeito a todo tipo de abusos dos políticos. Muitas das greves não se resumem a salários, mas também à reivindicações de melhoria das edificações, equipamentos e serviços que são utilizados pela população;

4) Muito comum é o discurso de que a estabilidade gera uma acomodação no servidor e daí resulta em um mau atendimento. Mas as telefonias privadas, transportadoras logísticas, bancos privados, etc., estão sempre sendo alvo de reclamações por péssimos serviços. O site Reclame Aqui mostra o quanto a iniciativa privada funciona mal, mesmo não havendo estabilidade;

5) O Brasil tem proporcionalmente menos servidores públicos que alguns países desenvolvidos (http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2016/10/30/internas_economia,555328/brasil-tem-menos-servidores-publicos-do-que-os-paises-desenvolvidos.shtml). O problema está na disparidade salarial, onde uns 10% recebem muito e os demais 90% recebem muito pouco, gerando desmotivação. A melhoria do serviço público não passa, portanto, pela redução do número de servidores ou pelo fim da estabilidade, mas pela redução das injustiças, dentro do próprio serviço público;

6) Estabilidade não significa farra. Nos últimos 15 anos, quase 7 mil servidores foram expulsos da Administração Pública (http://www.cgu.gov.br/noticias/2018/01/66-dos-servidores-federais-expulsos-em-2017-cometeram-atos-de-corrupcao). Corrupção é crime, tendo ou não estabilidade e não será a estabilidade ou ausência dela que impedirá um criminoso de agir. A mídia intencionalmente joga a população contra o serviço público, de forma a obter medidas que venham de encontro com seus interesses e dos interesses de seus aliados.

Pelo exposto, percebe-se que a estabilidade é algo que vai além de um direito do servidor, sendo possível dizer que é um direito da população. Dá-la ao servidor é dar alguma proteção a quem protege o patrimônio que é de todos.




terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Temer e sua Ponte para o Futuro precarizam o serviço público

NÃO SEJAMOS INGÊNUOS - Decreto do Temer extingue 60 mil vagas: entre o alarmismo e o realismo. 



Alguns colegas defendem que muitos de nós Bibliotecários estamos sendo alarmistas frente a uma meia dúzia de vagas de Bibliotecários extintas, especialmente no INCRA, através de decreto presidencial

Analisando os críticos ao nosso abaixo assinado e às notas das entidades bibliotecárias identifiquei 3 grupos: 1) Alguns denunciam um certo alarmismo por não gostarem de quem está criticando o decreto (CFB, CRB, anuidades, descontentamento pelo trabalho que fazem, etc.); 2) outros estão nutrindo uma simpatia pelo golpista pelo seu antiesquerdismo (se a Esquerda não gosta mais de Temer - visão deles é de que ter feito aliança significa amar o aliado momentâneo - então Temer não deve ser tão ruim); e 3) um terceiro grupo tentou tranquilizar colegas preocupados com o futuro, pois há um interesse econômico em evitar queda na quantidade dos inscritos para cursos preparatórios para concursos da área. Talvez esse terceiro grupo seja ingênuo demais para perceber as reais intenções da Standard&Poor's (S&P), quando rebaixa a nota do país frente a "tímidos cortes" e não vê que podemos estar assistindo a ponta do iceberg, não apenas meia dúzia de vagas a menos. 

É legítimo defender uma visão otimista, mas quando você chama o outro de "alarmista" isso merece uma defesa, pois você desqualifica a crítica atribuindo um adjetivo pejorativo ao denunciante, transformando-o num irresponsável que incendeia a área desnecessariamente ou com intenções político-ideológicas. Quando dissemos que o golpe era contra a classe trabalhadora e não contra o PT ou Dilma, muitos não acreditaram em nós. Agora muitos já percebem que Dilma era uma pedra no sapato e por isso foi removida. Que ela não saiu por causa das pedaladas fiscais, quando comparamos o volume de denúncias de corrupção contra Temer. 

No Brasil (mais do que em outros países) é preciso sempre tentar enxergar além das aparências. Talvez meia dúzia de vagas da Biblio não pareça muito, num primeiro olhar, mas a extinção de 60 mil vagas da Administração Pública é mais uma etapa do descompromisso governista com o serviço público e do compromisso desse grupo, que apoderou-se do poder com as políticas neoliberais, resultando num completo descaso com Educação e Cultura. É possível dizer que tal ação permite a hipótese de novos cortes na Biblioteconomia, o que transformaria os alarmistas em realistas. Não se trata de um pessimismo, pois quem acompanha os noticiários percebe que cada passo desse governo é um novo ataque aos que não estão no topo da parede. Já quem trabalha na área pública sabe que vagas de bibliotecários são transformadas em vagas de outras profissões o tempo todo. Exemplo: Uma biblioteca tem dois bibliotecários e um se aposenta. A direção vai lá e pede a transformação da vaga em um de Tecnologia da Informação ou Técnico em Assuntos Educacionais. Como a lei diz que deve ter, no mínimo, um bibliotecário nada podemos fazer senão esbravejar. Isso acontece no serviço público e acontece muito. Centenas de vagas de Economistas, Engenheiros e outros cargos foram extintos. Alguém duvida que o salve-se quem puder não vai se agravar internamente no serviço público? 60 mil vagas perdidas vai acirrar as disputas internas. Então mesmo que o governo não faça mais nada, já dificultou a criação de novos concursos para a área, pois plantou a semente da escassez de códigos de vagas. 

No fundo eu torço que meu realismo seja apenas um alarmismo. Mas será que no Brasil de Temer, que segue lutando para enfiar goela abaixo a filha do Roberto Jefferson, como Ministra do Trabalho (tendo ela sido condenada pela Justiça do Trabalho) gritar contra a extinção de vagas de bibliotecários, em meio ao corte de 60 mil vagas no serviço público é alarmismo? ou será realismo?